A vida por detrás da simplicidade

    Eu poderia começar o texto com palavras complicadas e impessoais, evitando usar o "eu" e analisando criticamente algum tema polêmico. É claro que poderia. Poderia também evitar repetições de palavras, pois afinal de contas, um texto que se preze não tem qualquer semelhança com a linguagem cotidiana.

    Para quê usar palavras objetivas e claras, quando existem as complexas e vagas para preencher longos períodos de tempo? É sempre bom incluir expressões como "sociologicamente falando", por mais que elas não acrescentem muita coisa ao sentido da sentença. E se for uma aula na qual seja preciso mascarar a falta de conteúdo, uma boa dose de gerundismo é sempre bem-vinda. Até porque, "Iremos estar desenvolvendo os aspectos decorrentes do assunto proposto pelo material didático" soa muito melhor que "Vamos seguir a apostila".
    Onde estou querendo chegar com toda essa ironia? Simples. As pessoas insistem em coisas desnecessárias. Não é uma crítica, pois muitas vezes também me incluo neste grupo; eu diria que é mais uma reflexão. Por que precisa ser tudo tão complicado? Não vou nem entrar no mérito do sistema educacional nesse texto, porém, é válida a linha de questionamento sobre a real necessidade de aprender, em média, doze matérias no ensino médio para se tornar alguém de prestígio.
    E no meio de tantas regras e burocracias massantes, fica difícil reconhecer a importância das coisas simples. Acordar por conta própria, sem compromissos; sentir o cheiro de café às manhãs; fazer e receber gentilezas gratuitas; admirar a infinidade do céu num dia ensolarado; jogar conversa fora por horas e horas com alguém querido. Pode parecer fútil, mas tudo isso faz parte de um lado lindo da vida que se esconde justamente onde menos se espera. Compare este descomplicado texto em prosa, por exemplo, a uma poesia carregada de vocábulos e metáforas que ninguém entende. Apesar da preferência acadêmica pela última opção, é inegável que estrutura simples da primeira a torna muito mais humana, por assim dizer.
    Insisto nessa questão porque muito da banalização que vemos hoje em dia é decorrente disso. A maioria dos relacionamentos amorosos são baseados apenas em pegação, demonstração de afeto através de presentes caros e meras formalidades, esquecendo-se das pequenas coisas que compõem verdadeiros laços, como perguntar — e realmente se importar — sobre como o dia da pessoa foi, ou trocar olhares tão profundos que chegam a ser mais significativos que palavras.
    Certa vez li em algum lugar que "mais vale meio quilo de comida saboreada e mastigada do que dois de comida engolida". A vida é certamente muito curta para ser desperdiçada, mas é ainda mais curta para ser vivida de forma mecânica, indiferente aos pequenos detalhes.

Pseudopolítica e plutocracia

O texto a seguir foi redigido com base na proposta de redação da FUVEST 2012: Participação política: indispensável ou superada? Confira a proposta completa e a coletânea disponibilizada clicando aqui.

    Diante da vigente estagnação política na qual se encontra a esmagadora parte da população brasileira, tem se discutido muito a participação — ou, no caso, a ausência da mesma — do povo nos processos políticos em geral. Não no quesito “votar”, pois o voto compulsório é previsto pelo Código Eleitoral do Brasil já há muitos anos, mas sim no que diz respeito ao real envolvimento político, implicitamente incluso nos direitos e deveres do cidadão.
    Isso porque, quando o assunto é política, nota-se um desinteresse devastador por parte das pessoas, tanto dos jovens quanto dos adultos. Muitos chegam até a orgulhosamente se autodenominarem “apolíticos”, como se estivessem se desresponsabilizando por todos os desastres sociais e econômicos provocados pela eleição de governantes ineficientes. Ora, estes não poderiam estar mais enganados! Uma vez que a pessoa se abstém dos direitos políticos, ela automaticamente se torna a maior responsável por deixar impune os que fazem uso do Poder Executivo para bem próprio. Esta escolha é tão sensata quanto votar cegamente, sem pesquisar os antecedentes do eleito ou do partido em questão.

    Seria insensato tentar encontrar o porquê de tal mentalidade popular, já que não existe uma causa exclusiva. A situação política brasileira atual é consequência de vários fatores desencadeados principalmente pelo individualismo. Isso está diretamente relacionado com a negação do “pensar coletivo”, produto do capitalismo, sistema profundamente enraizado em nossa sociedade. Portanto, a essência da política — priorizar o coletivo, mesmo que seja em detrimento do individual — acaba sendo invertida e o que sobra são só os processos burocráticos que mascaram o sistema corrompido.
    O único possível resultado disto tudo não é nada diferente do que encontramos nos dias de hoje: muitas eleições “compradas” através do coronelismo (conhecido também como "voto de cabresto", atrelado à manipulação de massa), constantes desvios de verba pública e uma população impotente e conformada. É claro que, sempre que podem, as pessoas reclamam e expõem seus pensamentos negativos e generalizados sobre a política nacional; entretanto, não movem um dedo para fazer algo a respeito. E ainda têm a pachorra de criticar os que vão às ruas para protestar, alegando que “não adianta”.
    Por fim, neste cenário onde as pessoas aceitam as condições impostas pelo descaso para com a população, a política deixa efetivamente de ser política e abre espaço para uma plutocracia informal, sistema no qual dominam os que possuem maior poder aquisitivo, em substituição à democracia, que não sai do papel. Portanto, se a questão for analisada sob um ângulo prático e desilusório, é possível inferir que a política não deixou de existir, até porque isto não seria possível; ela apenas adquiriu uma forma completamente distinta da ideal. Contudo, não resta dúvidas que esta alteração provocará consequências cada vez piores à sociedade, e a situação só será reversível por meio de drásticas reformas no sistema político.