Do céu e da guerra

    A música me fortalece. Dela retiro o sustento de meus ossos e a força que me mantém em pé, fazendo-me caminhar em frente, sempre de cabeça erguida para contemplar os céus e recuperar a beleza das estrelas que nos foi roubada pela modernidade febril. O céu! O mesmo céu que durante milênios ensinou à espécie humana o que significava ser magnânimo, intangível, intransponível! Que nos lembrava da nossa pequenez pueril, da nossa imersão irremediável no fundo do abismo de Gaia!
    1969. Tudo mudou. Atravessamos os ares, mergulhamos no vácuo do negrume infinito e nos abrigamos forçosamente na timidez da Lua. Ela, que antes se isolava em seu próprio esplendor curioso, tinha agora sua privacidade invadida por pés galopantes e sua virgindade violada por bandeiras de nações distintas, egoístas, perdidas na briga tola de egos insignificantes. Fez-se a guerra. Banhou-se de sangue territórios inteiros, terras de ninguém, a mando dos poderosos que se deliciavam em seus charutos de grife.
    E assim se ergueu a humanidade: sob a música, que erigiu povos e amores, tida como estupidez vaidosa, e sob a ganância por cifrões vazios vistos como o bem necessário ao progresso. Amém?