Publicidade infantil e o lucro ilegítimo

A minha crítica é que, apesar de haver vários temas oportunos que dizem respeito a este ano, como a Copa do Mundo, o problema da escassez de água em São Paulo, os cinquenta anos de Golpe Militar ou mesmo as questões territoriais dos curdos, palestinos, catalães e escoceses, o Enem resolveu propor uma temática completamente inesperada e descontextualizada. Isso fez com que, de certo modo, eu precisasse maquear minha falta de posição sólida em relação ao assunto utilizando um vocabulário rebuscado; talvez até demais.
Temática de redação do Enem 2014: "Publicidade infantil em questão no Brasil". Clique aqui para ler a proposta e a coletânea.
    A dinâmica social de um século atrás é, decerto, deveras distinta da atual, pois esta última engloba sistemas cuja tecnologia era impensável antes da Revolução Informacional. Parte disso está intimamente ligado com a mídia, a qual desempenha um papel decisivo na sociedade contemporânea, o que inevitavelmente implica em graves efeitos em nossa vida e na das crianças, embora alguns setores — especialmente os que lucram com isso — recusem-se a admitir.
    A relevância midiática em nosso modo de pensar e agir já foi brilhantemente notada e estudada pelos sociólogos da Escola de Frankfurt, precursora de um tipo de antropologia alemã. As consequências do consumo de informações são, conforme concluído pelos próprios estudiosos, profundas, sobretudo se este consumo for de cunho inconsequente e desenfreado. Tendo consciência disso e da perigosa influenciabilidade à qual estão suscetíveis as crianças, o Conselho Nacional de Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) determinou a abusividade de quaisquer propagandas que visem a este público.
    Esta decisão causou uma certa revolta e, inclusive, uma tórpida desconfiança na legitimidade do Conanda para estabelecer tal medida, o que revela o quão desesperadas estão as empresas deste segmento para lucrar, ainda que a custo de tirar proveito do razo e parco senso crítico das crianças. No entanto, por maior que seja a resistência corporativista, é não somente bem-vinda como também necessária a ação que impede o bombardeio de incentivo consumista ao público infantil. A criança deve sim ser preparada para o mundo, porém, jamais exposta prematuramente a ele de forma negligente.
    Nesse sentido, é genuinamente requerida a proibição de propagandas de natureza persuasiva aos pequenos, assim como já acontece em lugares altamente desenvolvidos tais como o estado canadense do Quebec ou a Noruega. Ademais, é preciso que o sistema educacional atualize-se e adapte-se à contemporaneidade, criando e aperfeiçoando uma matéria escolar de cidadania que obrigatoriamente abarque o consumo consciente, tendo sempre a razão como sustentáculo de modo a sobrepor a danosa influência midiática.